sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Cidadania?!...

Provocação exordial
Cidadania é o atributo ínsito do ser humano que está inserido numa sociedade organizada num espaço geopolítico, afetado de direitos e deveres para com a ordem sociopolítica ali pactuada, pelo que vem a ser chamado cidadão. Cidadania presume-se algo bom em si, e, nessa boa compreensão, deveria atingir (no sentido de qualificar, beneficiar) igualitariamente a todos os seres humanos dessa ordem social, sem qualquer acepção nem distinção. Desafortunadamente, contudo, isso não se verifica. Por que isso se dá? Esse é o ponto de discussão deste artigo.

Eis como se expressa a pt.Wikipedia:
"Cidadania (do latim, civitas, "cidade")[1] é o conjunto de direitos e deveres ao qual um indivíduo está sujeito em relação à sociedade em que vive.[2]
O conceito de cidadania sempre esteve fortemente "ligado" à noção de direitos, especialmente os direitos políticos, que permitem ao indivíduo intervir na direção dos negócios públicos do Estado, participando de modo direto ou indireto na formação do governo e na sua administração, seja ao votar (direto), seja ao concorrer a um cargo público (indireto).[3] No entanto, dentro de uma democracia, a própria definição de Direito, pressupõe a contrapartida de deveres, uma vez que em uma coletividade os direitos de um indivíduo são garantidos a partir do cumprimento dos deveres dos demais componentes da sociedade[4] "
[...]
Diz-se da nossa Constituição Federal de 1988 que é Constituição Cidadã. Ponto.
Ressalvados alguns equívocos fundamentais — distribuídos ampla e generosamente entre formais e materiais, acidentais e intencionais, entre tantos — a sua qualificação como "cidadã" é, per se, verdadeira. Talvez, o grande problema dessa nossa tão sofrida [ativa e passivamente] Constituição seja o fato de esbarrar em palavrinha incômoda — o altruísmo. Ou, conversamente, na sua contraparente (bem mais notória, embora veladamente ignorada como se não existisse...), o... — teremos coragem de decliná-lo? —  egoísmoGeorge Orwell expressa-o meridianamente ao dizer : "todos são iguais perante a lei, mas alguns são mais iguais que outros". ¡¿Por que?!

É imensamente oportuno apresentar a visão de um ator sociopolítico já consagrado, expressando-se sobre a matéria em comento. Eis, pois, a visão do jurista Ives Gandra da Silva Martins:


Branco, honesto, contribuinte, eleitor, hétero... Pra quê?
 IvesGandra.jpg

Ives Gandra da Silva Martins *

Hoje, tenho eu a impressão de que o "cidadão comum e branco" é agressivamente discriminado pelas autoridades e pela legislação infraconstitucional, a favor de outros cidadãos, desde que sejam índios, afrodescendentes, homossexuais ou se autodeclarem pertencentes a minorias submetidas a possíveis preconceitos.

Assim é que, se um branco, um índio e um afrodescendente tiverem a mesma nota em um vestibular, pouco acima da linha de corte para ingresso nas Universidades e as vagas forem limitadas, o branco será excluído, de imediato, a favor de um delesEm igualdade de condições, o branco é um cidadão inferior e deve ser discriminado, apesar da Lei Maior.
Os índiosque, pela Constituição (art. 231), só deveriam ter direito às terras que ocupassem em 5 de outubro de 1988, por lei infraconstitucional houveram direito a terras ocupadas no passado. Menos de meio milhão de índios brasileiros — sem contar argentinos, bolivianos, paraguaios, uruguaios que pretendem ser beneficiados também — passaram a ser donos de 15% do território nacional, enquanto os 185 milhões de habitantes dispõem apenas de 85% dele. Nessa exegese equivocada da Lei Suprema, todos os brasileiros não-índios foram discriminados.
Aos 'quilombolas', que deveriam ser apenas os descendentes dos participantes de quilombos, e não os afrodescendentes, em geral, que vivem em torno daquelas antigas comunidades, tem sido destinada, também, parcela de território consideravelmente maior do que a Constituição permite (art. 68 ADCT), em clara discriminação ao cidadão que não se enquadra nesse conceito.
Os homossexuais obtiveram do [então] Presidente Lula e da [então] Ministra Dilma Roussef o direito de ter congresso financiado por dinheiro público, para realçar as suas tendências —algo que um cidadão comum jamais conseguiria!
Os invasores de terrasque violentam, diariamente, a Constituição, vão passar a ter aposentadoria, num reconhecimento explícito de que o governo considera, mais que legítima, meritória a conduta consistente em agredir o direito. Trata-se de clara discriminação em relação ao cidadão comum, desempregado, que não tem esse 'privilégio', porque cumpre a lei.
Desertores, assaltantes de bancos e assassinos, que, no passado, participaram da guerrilha, garantem a seus descendentes polpudas indenizações, pagas pelos contribuintes brasileiros. Está, hoje, em torno de 4 bilhões de reais o retirado dos pagadores de tributos para 'ressarcir' aqueles que resolveram pegar em armas contra o governo militar ou se disseram perseguidos.
Tantas discriminações. Pergunta: de que vale o inciso IV do art. 3º da Lei Suprema?
Como modesto advogado, cidadão comum e brancosinto-me discriminado e cada vez com menos espaço, nesta terra de castas e privilégios.

(*Ives Gandra da Silva Martins é renomado jurista e professor emérito das universidades Mackenzie e UNIFMU e da Escola de Comando e Estado do Exército e presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo).


Para aqueles que desconhecem, eis o inciso IV do art. 3° da CF a que se refere o Professor Doutor Ives Gandra da Silva Martins, em sua íntegra:

"Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[…] (Omissis)
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."

Assim, pois, volta a ser atual — nunca deixou de sê-lo — a constatação do grande Rui Barbosa:

"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto". (Senado Federal, RJ. Obras Completas, Rui Barbosa. v. 41, t. 3, 1914, p. 86)